“A inocência é um abismo sem âncora possível” : a representação feminina e o amor romântico em Fanny Owen, de Agustina Bessa-Luís

Abstract

O presente trabalho investiga a obra Fanny Owen (1979), de Agustina Bessa-Luís (1922-2019), romance contemporâneo que conta uma história densamente romântica, envolvendo triângulo amoroso, rapto, abandono, inveja, ciúme e vingança, morte por enfermidade e por desgosto, suicídio. A protagonista, Fanny, é tida como uma mulher angelical e demoníaca, com um poder de atração irresistível e capaz de provocar paixões devastadoras, ou seja, uma personagem que representa uma espécie de símbolo erótico, que é desprovida de alma e manipulada pelos seus dois pretendentes (José Augusto Pinto de Magalhães, um morgado duriense e Camilo Castelo Branco, escritor e amigo de José Augusto), ao mesmo tempo em que é apresentada como uma condutora de desejo, de domínio e de paixão. Destaca-se ainda que se trata de um romance composto por uma narrativa supostamente verídica (uma biografia ficcional), passada em1850,obtidaatravésdas confissões presentes em diversos momentos e livros do próprio Camilo e das palavras de Fanny e José Augusto, colhidas de seus diários pessoais, o que implica na indagação da veracidade/falsidade das inúmeras versões da história amorosa vivida pelos três personagens. Assim, a pesquisa objetiva identificar a constituição histórica do sujeito feminino e o amor romântico, a partir dos estereótipos românticos, dos entraves patriarcais, bem como das complexas relações de classe, no século XIX, retratados nas trajetórias da ambivalente Fanny e de seus pares apaixonados.