Repercussão dos estereótipos heroicos e sacrais da Enfermagem na mídia jornalística durante a pandemia da Covid-19

Abstract

A pandemia da COVID-19 decretada pela OMS (2020) foi uma crise que afetou todos os setores globais. Na área da saúde, a classe de trabalhadoras/es sofreu com a falta de insumos e desigualdade social, incidindo principalmente sobre a enfermagem, que atua nos diversos níveis de atenção, desde a promoção em saúde até cuidados especializados. Este estudo se justifica pela necessidade de discutir a repercussão das práticas de enfermagem durante a pandemia da COVID-19 nos veículos midiáticos, nos quais foi exposta a importância das/os profissionais na atuação dos serviços de saúde. Essa visibilidade foi acompanhada de exposição da classe por meio de imagens midiáticas das/os enfermeiras/os o que reforçou a ideia de anjos e heróis, representações que não correspondem à realidade precarizada do trabalho, que antes permanecia invisível. As imagens de anjos e heróis emergem paralelamente aos históricos estereótipos de gênero, associadas ao trabalho advindo de atributos femininos, que por sua vez foram cunhados na moral cristã, presentes em todo o processo de profissionalização da enfermagem. A pesquisa foi realizada em duas etapas: inicialmente foi efetuada uma revisão de escopo por meio da qual foram selecionadas produções da enfermagem que faziam referência às imagens de “anjo” e “herói” dos enfermeiros/as citadas no cenário pandêmico e apresentadas as características da imagem midiática identificadas nos artigos. A segunda etapa constitui-se em uma pesquisa documental com abordagem qualitativa. Por meio da coleta de dados, foram buscados artigos e notícias jornalísticas sobre a enfermagem no cenário da pandemia de COVID-19, em meio eletrônico, buscando-se identificar os estereótipos morais e de gênero nos conteúdos. A busca incluiu o período de 2020 e 2021, e os achados foram tratados por meio da análise temática. Os resultados indicaram que, apesar de a profissão ser protagonista nos cenários de crise, especialmente em emergências sanitárias, a visão geral sobre a enfermagem está associada majoritariamente ao seu desenvolvimento histórico, que vincula a enfermeira a atributos morais de dádiva, doação, entrega. Isso acentua desigualdades sociais no trabalho e sinaliza para a sociedade que estes profissionais precisam apenas de aplausos ocasionais, desfavorecendo o avanço para um piso salarial com carga horária justa ao ofício. No entanto, algumas matérias em sites e documentos das organizações da categoria fizeram o contraponto, como resistência crítica às imagens midiáticas que reeditam estereótipos na profissão. É de fulcral importância que os enfermeiros/as profissionais de enfermagem saibam de sua origem histórica, para analisar os estereótipos de “anjo branco” e “herói” para a transformação de sua realidade social e política.